sábado, 27 de agosto de 2011

O ser e a tela


Na sala de paredes brancas
Há uma grande e colorida tela
Uma poltrona e um ser a observar
Sem saber ao certo por onde começar

Do silêncio às vezes urgente
Faz-se necessária a observação
O olhar sereno da primeira impressão
Deixar a tela fazer a sua comunicação

As cores e formas exibem-se
Contam das partes que lhe cabem
Sabedoras de como pensam existir
Em primeiro plano é só superfície

O ser procura ouvir seus matizes
Os claros e delicados tons contrastam
Com o que dizem suas mudas sombras
No abstrato é confusa a percepção

É nessa confusão que o ser mergulha
A procurar a dinâmica das pinceladas
Vasculha curioso onde a tela foi iniciada
Para mostrar que ela ainda é inacabada

E corre o tempo por contrastes e luzes
E se joga ao perceber camadas de tintas
As perspectivas disformes viram palcos
E das contidas devolutivas a tela escorre

Movimentam-se aos poucos as cores vibrantes
Outras são como mutantes reinventam-se
Tomadas de si mesmas acalmam-se caladas
As destemperadas refugiam-se diluídas

Aos poucos é outra tela das mesmas tintas
Uma releitura feita da coragem da entrega
O ser tanto quanto é saí manchado da alegria
De ter apreciado mais um quadro inacabado.

(FlaVcast – 27.08.2011)

* ao dia do psicólogo
** em especial à Karinne

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Perder


Perder
Mesmo defendido
É duro

Feito rocha
Que rola a levar ente
Que nos joga
No vazio

Não se tem como lutar
É uma solidão
Que não se quer
Ninguém

Uma escuridão
De nos apagarmos
De repente

E se acostuma
Com uma culpa
Que não se sabe
Do que

É perda

Sem explicação
Como ter que acreditar
Na fé que não se vive
No dia a dia

Ter que perdoar
A perda?

E o que se faz?

Voraz o amor consome
Como buraco negro
Come por dentro
Em desejo de explosão

O que faço?
Maldição

A perda perversa
Detona raiva
Consome em desespero

Tem tempero
Não dá arrego
Vive no pensamento
Transforma-se
Em juramento
Ou xingamento

E tantos lamentos

A perda
Deixada para trás
Com o seu próprio peso
Fica estática
Diminuindo na distância
Exatamente oposta
Aos passos

Solitários passos
Por riscas brancas
Que levam ao entender
Porque às vezes
É o outro que perde

Do amor que vive

Cabe a própria dor
O degustar o vinho
Ao sabor etílico
De imagens revistas

Num embriagar
Soturno se percebe
Que tudo no amor
É intenso

Feito poeta bêbado
A escrever
Juras de amor.

(FlaVcast – 26.08.2011)

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Vira lata

 
Enquanto dormes
Fico sob vigília
Deitado
Ao pé da cama
Rosno replicantes
Resmungos tristes
Agitam os pêlos
Em duas patadas
A pulga já era.

(FlaVcast – 24.08.2011)

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Vestido branco



A tarde
apressa-se a abrandar o dia
a despejar vermelhos incandescentes
e trazer ao ar ondas divertidas de ventos
como o bailar das folhas caídas
crisântemos pendem solenes aromas
as flores exalavam o caminho
e lá vem ela menina
no fim da perspectiva
a brilhar entre os raios de sol
os cabelos soltos
possuem o ritmo da sua alegria
ao passar por entre as sombras
estas iluminam-se em reflexo
ao branco do vestido curto
segundos são eternos
entre o zigue zague das suas atenções
e o divertido chutar as pedras
e levantar a poeira da minha imaginação
por trás do vidro da janela
não há vento é cálido
ambiente cercado de penumbra
é contemplação da sua beleza
a aproximar-se das batidas do meu coração
areja as dores da minha solidão
e vem sedutoramente a sorrir
sabedora do meu olhar envidraçado
a cada passo em minha direção
trás um pulsar de vida
e um espantar alegre a minha nostalgia
perco-me no espaço da sua caminhada
soturno em pensamentos vagos
só desperto quando por trás da cerca
branca em pernas torneadas e seios amanteigados
sorri e maliciosamente grita
a chamar-me para ver a lua
aquela nossa a surgir no mar
e faz-se noite em seu vestido branco
deixado delicadamente na areia
é farol a nos indicar o caminho de volta.

(FlaVcast – 18.08.2011)

sábado, 13 de agosto de 2011

Tomados de aroma de vinho


Parecia acolhedor
O quarto a meia luz
Tomados de aroma de vinho
E pétalas de rosas vermelhas
Deliberadamente espalhadas
Pelo chão de tábuas largas
Por onde as roupas perdidas
Denunciavam marcada nudez
Em meio aos toques silêncio
Detalhes partilhados em beijos
Compunham a dança lenta
Das imagens refletidas no espelho
Como se fossem velhos amantes
Os sentimentos se reconheciam
E profundos em gozo explodiam.

(FlavCast - 13.08.2011)

Razão


A palavra foi a razão
Pela qual a sedução
Aconteceu em tons
Curtos de cinzas
Às chamas delirantes
Dos prazeres mundanos
Dos corpos humanos
Atirados em queda livre
Por entre as atmosferas
Profanas do amor terreno
Adquirido em letras
Combinações de milhares
De fonemas imagens
Traduzidos em cores
Mesclam conceitos incertos
Cúmplices sorriam pretextos
Suficientemente doces
Para fazerem da razão
A conjunção perfeita da união.

(FlavCast – 13.08.2011)

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Meu ofício amar


Meu ofício amar
A cor e as sutilezas
das gotas
a escorrerem
lânguidas

Ofício do olhar
Que busca no ângulo
o oposto sectário
do que chamo
normal

Sentir como ofício
Da pele tesa
mistura e leva
embriagada
à tara

Tocar por ofício
Em que perdido
entrego-me
desvendar de sutis
arrepios

Ofício palavra
Perdida poesia
apenas soprada
pousada de leve
em seu ouvido.

(FlavCast – 12.08.2011)

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Dadivosa concubina


Quem mais
A não ser você
Poderia colorir
Meus sonhos
Trazer
Depois da chuva azul
Dias risonhos e lua seminua

Escancarada de luz
Sem pudor
Desejar em versos
Despi-la
Como se estes
A tomassem deleita
Dos braços sutis do poema

Quem mais
A não ser você
Declararia seu amor vulgar
Como perfume
A percorrer o ar
Em inebriantes notas
Conquista

Esquálida e profana
Espalha-se
Dadivosa concubina
Em pêlos
Nutre de perigo os caminhos
Não importa
Em meus braços a tenho.

(FlavCast – 09.08.2011)

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Pra que mais


Pra que mais
nem sei

Se os verbos
precisam incertos
do espaço comedido
dos lábios dos amantes

Pra que mais
nem sei

Se as verdades
soam fecundas
oriundas dos cometas
que passam vazios no céu

Pra que mais
nem sei

Se não é inteiro
o pedaço de vermelho
que escorre feito tinteiro
das convenções da emoção

Pra que mais
nem sei

Se o sol esquenta
envolto em negro
iluminado de estrelas
explode em magnetismo

Pra que mais
nem sei

Se dizer do amor
não leva tempo
à fala dos alcoviteiros
covardes personagens

Pra que mais
nem sei.

(FlavCast – 08.08.2011)

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Poema concreto


Vou fazer-te como poema
Literalmente escolher a dedo
A intensidade do toque
Também o peso das palavras

Ter em mente o caminho
No qual percorrer as frases
Do teu corpo ondulado e nu
Envolver-te o pensamento

Dizer do poeta pelo olhar
A rima perfeita do teu beijar
Do amor na volúpia dizer
Do meu desejo de criar prazer

Carregar-te hipnotizada de versos
Nos quais a maciez da tua pele escrevo
Imprimindo os ritmos dos movimentos
Para dentro do verdadeiro poema concreto.

(FlavCast – 03.08.2011)